sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Zé Ramalho, vida e obra em coleção

"Acervo corre risco de se degradar pela ação do tempo. Falta museu para acondicionar peças do cantor de Brejo do Cruz"


Místico, enigmático e apocalíptico, o cantor e compositor Zé Ramalho, é um dos poucos paraibanos que alçaram voos altos, divulgando a essência do Nordeste nos cantos mais longínquos do país. A música de Zé Ramalho é uma verdadeira miscigenação de
ritmos e brasilidade, evocando os espíritos
dylanianos gonzagueanos e raulseixistas, além de uma forte mistura da Literatura de Cordel, dos violeiros nordestinos, do blues e do rock.

Nascido no sopé da Pedra de Turmalina em Brejo do Cruz, no Sertão Paraibano de Brejo do Cruz, o poeta visionário Zé Ramalho se transformou em uma expressão viva da cultura nordestina que consegue envolver o público com seu "vozeirão" e suas letras "proféticas". Só que a cidade onde nasceu o herdeiro do "Avohai", ainda não despertou para a importância de preservar a memória de um de seus ícones. A população de Brejo do Cruz, uma cidade pequena, com pouco mais de 13 mil habitantes, desconhece a história do lugar e de seus artistas. Prova disso é que há anos um fotógrafo luta para conseguir um espaço adequado para guardar a segunda maior coleção da história de Zé Ramalho. A coleção contando a vida e a obra do cantor, está se perdendo justamente por falta de um museu que guarde para a posteridade a memória do artista.
O acervo pertence ao pesquisador e fotógrafo Aurilio Santos. Com mais de 500 peças distribuídas em revistas, jornais, documentos, cartazes, clipes, shows, livros, roupas, objetos pessoais, entrevistas, folder, discografia em vinil, cordéis, pôster, fotografias antigas, DVDs e CDs, além de outros materiais pessoais que marcaram toda a trajetória de Zé, o acervo ainda não foi descoberto pelo poder público do município. Todo material encontra-se dentro de caixas de papelão, em situação degradante, exposto a traças e a cupins, sem levar em consideração a temperatura do ambiente. O acervo, conforme observou Aurílio está numa casa que também não oferece condições de segurança, e a qualquer momento esse material pode ser roubado. "É precisoque este material fique num espaço com segurança antes que seja tarde demais", observou Aurílio Santos.
O fotógrafo que acompanha a carreira de Zé Ramalho há mais de 20 anos sonha com o dia em que enfim, será disponibilizado um espaço para ele guardar os fragmentos históricos do mais ilustre filho de Brejo do Cruz. Ao longo desse tempo, Aurílio conseguiu catalogar esse vasto material que conta toda a trajetória do artista desde a sua família, passando pela carreira, relação com fãs e amigos até a sua consagração no Rio de Janeiro. Só CDs são 150, sem contar os 5 DVDs gravados pelo cantor, entre outras obras fonográficas.
Aurílio teme que com um tempo, o material se perca. A maior preocupação do idealizador da coleção é com o acervo fotográfico. "Estou preocupado com a preservação do acervo, pois tenho dificuldades financeiras para pagar o aluguel da casa onde está guardado este patrimônio", diz. Segundo ele, muitas fotografias precisam ser emolduradas, os documentos serem posto em pastas de plásticos e outros. "Até o momento as autoridades locais do município de Brejo do Cruz desconhecem o potencial deste patrimônio cultural que será de grande importância para as futuras gerações" diz.
Há anos o fotógrafo luta para ver se consegue pelo menos uma sala em Brejo do Cruz para guardar a obra. O material catalogado por Aurílio guarda mesmo os fragmentos do homem do "Avohai". Ele reúne por exemplo fotos revelando detalhes e particularidades de Zé Ramalho com a familia. Aurílio Santos já teve vários momentos com Zé Ramalho principalmente em shows, e mostrou a ele parte do material. Zé não escondeu o desejo de ver a obra em museu. A dedicação ao autor de Chão de Giz, Vida de Gado, lhe rendeu um livro de cordel Aurílio Santos O olhar criador, Zé Ramalho o ancestral da palavra escrito pelo poeta Manoel Monteiro (Editora Gráfica Real) .
Patrimônio valoriza o artista paraibano.
O fotógrafo e pesquisador Aurilio Santos revelou que construiu a coleção como forma de manter viva a obra musical de Zé Ramalho. Brejo do Cruz, segundo ele, poderia valorizar mais o artista renomado criando um espaço onde se trata de reunir a trajetória e a história do filho ilustre Zé Ramalho. "Certamente despertaria maiores interesses no aspecto do turismo da cidade e da região" diz.
Lutar pela memória do compositor e cantor Zé Ramalho, tem sido um dos motivos que me impulsionou Aurílio Santos, em preservar e pesquisar tudo que se fala do músico e compositor Zé Ramalho. Aurílio conta que se eu tivesse condições alugaria uma casa e transformaria num Museu Zé Ramalho Vida e Obra, para que esse material fosse de fato preservado em condições adequado.
Desde 1998 ele vem catando e adquirindo tudo o que se diz e se fala deste poeta nascido em Brejo do Cruz. "O próprio artista tem me presenteado para acrescentar ao acervo. Aurílio acredita que este acervo pode ser o segundo maior sobre o artista Zé Ramalho". O primeiro está não mãos do Rivanildo Alexandrino, residente em Frutuoso Gomes, do Rio Grande do Norte. O acervo tem raridades que o próprio artista não o tem, é de grande importância para nós ter isto. Gratifica-nos".
O acervo tem um grande valor histórico já que os documentos bibliográficos mostram a trajetória artística do cantor e compositor Zé Ramalho de reconhecimentos, nacional por suas canções apocalípticas e sonoridade sertaneja. Toda a homenagem é pouca para que a memória do poeta visionário Zé Ramalho não se apague nas gerações futuras. e saibam que tanto devem a gente pesquisadores e fãs.
O fotógrafo Aurílio Santos é paraibano de Brejo do Cruz e ainda resiste lá, onde registra a infância dos meninos do Sertão. Sempre manifestou interesse pela obra do conterrâneo Zé Ramalho e pela arte fotográfica. Além de participar de várias exposições coletivas, o fotógrafo realizou diversas individuais em diversos lugares na Paraíba e em outros estados do pais. No seu trabalho, Aurilio Santos tem sempre mostradoa preocupação em evidenciar elementos da paisagem e cultura regionais. Ele é o autor de fotos do CD Paisagem de Interior de Jessier Quirino. E recentemente citado no livro Zé Ramalho o profeta do terceiro milênio, O Apolo da Caatinga de Isaac Soares de Sousa. Jornalista de São Carlos, São Paulo.
Diario da Borborema em 25/01/2011
Severino Lopes
Foto: Zé Ramalho e Aurílio Santos, Acervo Pessoal/Divulgação/D.A Press

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Paêbirú vai Virar documentário!!!


"A história do disco mais caro do Brasil, valendo até R$ 5 mil, é investigada em documentário"
RIO - Inscrições rupestres misteriosas, mitos indígenas, boas doses de psicodelia, uma busca para reconstruir as obscuras origens de uma lenda da música brasileira... O roteiro tem elementos que parecem moldados para a ficção, algo como um Indiana Jones lisérgico. Mas “Nas paredes da pedra encantada”, filme de Cristiano Bastos e Leonardo Bonfim, é um documentário — um “road doc”, como define Cristiano — que investiga a história do raríssimo disco “Paêbirú: Caminho da Montanha do Sol”, de Zé Ramalho e Lula Côrtes, lançado em 1975.

— Há vários motivos para se falar de “Paêbirú” — defende Cristiano. — É o disco mais caro do Brasil, sua última cotação está entre R$ 4 mil e R$ 5 mil, o dobro do “Louco por você”, o primeiro de Roberto Carlos >ita<(existe uma edição pirata, em vinil, de “Paêbirú”, lançada na Europa, mas que não vem com o livro que acompanhava o original, trazendo estudos sobre a região e informações sobre a lenda do Caminho da Montanha do Sol). Mais que a raridade, ele é o fundador de uma psicodelia genuinamente brasileira, com elementos da cultura indígena. E sua história tem toda uma mística. Das únicas 1.300 cópias da prensagem original, 1.000 foram perdidas numa enchente em Recife. Nunca vi uma história tão fantástica como a que circunda esse álbum.

Jornalista, Cristiano tomou contato com a fantástica história quando fez uma reportagem para a revista “Rolling Stone” sobre o disco. Quando percebeu que sua apuração poderia render um documentário, se lançou com Leonardo Bonfim na aventura de tentar reconstituir os fatores que permitiram o surgimento do álbum. O termo “aventura” não é exagero. Cristiano morou entre Pernambuco e Paraíba por três meses, investiu dinheiro do seu bolso no filme — atualmente em fase de montagem — e penou para encontrar seus personagens. Mais que isso, quase foi preso durante as filmagens:

— Estávamos na cidade do Ingá do Bacamarte (município da Paraíba onde se localiza a Pedra do Ingá, onde estavam as inscrições que serviram de estopim para o processo criativo que gerou o disco) quando a polícia nos abordou, com vários carros e armas apontadas para nós. Estava havendo uma onda de assaltos a bancos na região, e eles, vendo aquele grupo andando de um lado para o outro e fazendo ligações, acharam que éramos ladrões. Tivemos que ser libertados pelo prefeito, que já sabia do projeto e inclusive colaborou com dinheiro para as filmagens.

O filme — ao qual O GLOBO teve acesso exclusivo — traz entrevistas com personagens como os músicos Lula Côrtes e Alceu Valença (que toca no disco), o arqueólogo Raul Córdula (que apresentou a Pedra do Ingá a Lula e a Zé Ramalho) e a cineasta Kátia Mesel (companheira de Lula então e sócia dele no selo Abrakadabra, que lançou o disco). As gravações registram muitos momentos musicais espontâneos e até cenas que reforçam as lendas em torno do disco.
— Cada lado do álbum duplo de “Paêbirú” tem um conceito: fogo, terra, ar e água. Cada um tem uma sonoridade. Fogo é o lado mais roqueiro, ar são músicas mais etéreas... No lado da água, tem uma parte que faz louvações a Iemanjá. No filme, quando Kátia Mesel canta isso, começa a chover — narra Cristiano, que alimenta mais um tanto a mística ao dedicar o filme ao deus Sumé (parte da mitologia de “Paêbirú”).

Zé Ramalho — que até hoje visita a Pedra e acredita que extraterrestres estão por trás de suas inscrições — não dá depoimento para o filme. Mas autorizou os diretores a usar todas as músicas para contar a história.

— Existe uma rusga entre Zé e Lula, e Zé preferiu não falar sobre o álbum. Mas todos no filme falam dele com muito carinho — nota Cristiano. — Apesar de negar a entrevista, Zé foi muito gente fina, fez um documento liberando a música... Só não queria ter a imagem dele hoje no filme. Ele pergunta por que não falaram do disco quando ele foi lançado (o álbum foi completamente ignorado na época). Aquilo foi muito decepcionante. Além de tudo, Zé Ramalho considera a obra que ele fez solo, posteriormente, muito mais importante. Como o disco tinha um aspecto coletivo, ele ali não tem o peso de ser o portador da mensagem, é só mais uma das vozes.

Mesmo antes da finalização, os diretores já receberam convites para apresentar o filme em festivais.

— Nosso desejo é estrear no “É tudo verdade” — diz Cristiano. — Seria ótimo também ter a exibição na TV, num espaço como o Canal Brasil.

Eles contam com a força da história. E os poderes de Sumé.
Fonte: EXTRA